Lei da ficha limpa vale para as eleições de 2010 e será retroativa
Ingrid de Andrade, Natália Silva e Wanderson Nascimento
Sancionada pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT) no dia 4 de junho de 2010, a Lei Complementar 135/2010, conhecida popularmente por Lei da Ficha Limpa já “barrou” 16 registros de candidaturas somente em Minas Gerais. A medida altera a Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, que estabelece casos de inelegibilidade, prazos de cassação e determina outras providências.
Até o dia 10 de agosto o número de candidatos barrados pela Lei da Ficha Limpa chegava a 136. A quantidade representa aproximadamente 25% das candidaturas contestadas pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) em todo o Brasil. A porcentagem se refere ao levantamento divulgado na terça-feira, 10 de agosto, pelo site Congresso em Foco, com base em dados repassados por 19 dos 27 Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) do País. De acordo com o levantamento, o maior número de candidatos barrados foi constatado no Ceará, que teve 29 impugnações da Procuradoria Eleitoral julgadas procedentes pela Justiça e, em seguida, figuram os Estados de Rondônia (24) e Minas Gerais (16). Outra notícia divulgada pelo site Congresso em Foco no dia 05 de agosto e atualizada em 27 de agosto informava que o número de candidatos barrados em todo o país pela Lei Ficha Limpa já alcançava quase 220 nomes.
No dia 25 de agosto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) barrou por 5 votos a 2 o primeiro candidato com base na Lei da Ficha Limpa, o deputado estadual Francisco das Chagas (PSB-CE), que disputa a reeleição – em 2006, ele foi condenado por captação ilícita de voto. O TSE também decidiu, pela primeira vez, que os efeitos da lei se estendem a situações ocorridas sob a vigência de legislação anterior, que estabelecia penas mais brandas.
Uma vez que Lei da Ficha Limpa passou a ser retroativa, políticos da região podem ser impedidos de se candidatarem nas próximas eleições municipais em 2012. O atual prefeito de São João Del-Rei, Nivaldo José de Andrade (PMDB), teve sua candidatura contestada “por faltar-lhe uma das mais importantes condições de elegibilidade implícita, a moralidade”, de acordo com o documento protocolado no dia 19 de julho de 2009, pelo promotor de Justiça Antônio Pedro da Silva Melo. Segundo notícia publicada no jornal Folha das Vertentes em julho de 2008, o promotor afirma que, durante o mandato do peemedebista, entre os anos de 2001 e 2004, “Nivaldo usou e abusou dos recursos financeiros do município como se fossem seus. Ao encerrar seu governo, deixou os cofres públicos em situação de grande penúria”. Além disso, o documento da promotoria aponta que Nivaldo “teve conduta irresponsável, inconseqüente e até leviana ao renunciar a receitas através de criminosas práticas fisiológicas e eleitoreiras de isenção de tributos, o que causou graves danos ao tesouro público”.
Conforme a denúncia do promotor, o então prefeito deixava de arrecadar tributos e taxas devidos à cidade e, por outro lado, gastava com diárias de viagem sem a devida comprovação. Dessa forma, Antônio Melo concluiu que o candidato Nivaldo não preenchia todas as condições de elegibilidade previstas em lei, sobretudo o que diz respeito à moralidade pública. Contudo, Nivaldo entrou com recurso no TRE e conseguiu lançar candidatura e eleger-se prefeito da cidade na última eleição municipal, em 2008. O advogado de defesa do prefeito, Fuad Maluf, afirmou para o Jornal Folha das Vertentes que o pedido de impugnação da candidatura é totalmente descabido. “Não existe processo contra Nivaldo, sequer em primeira instância”, disse. Para Fuad, o processo é inconstitucional, pois fere o princípio de elegibilidade. O advogado disse, ainda, que irá contestar o pedido do Ministério Público, “antes mesmo do prazo final”.
Para se opor à candidatura de Nivaldo, o Ministério Público se baseou na Lei Complementar número 64/1990, que estabelece outros casos de inelegibilidade a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato, considerando a vida pregressa do candidato. Atualmente, há 62 processos envolvendo o nome do prefeito. Ao ser procurado, o prefeito recusou responder sobre o assunto, alegando estar em sua residência e não ter tempo para conceder uma entrevista. Na Prefeitura, a assessoria de imprensa também não quis se pronunciar sobre o assunto. Sobre os processos que envolvem o prefeito Nivaldo, acessar http://www.tjmg.jus.br/juridico/sf/proc_resultado_nome.jsp?nomePessoa=Nivaldo+Jos%E9+de+Andrade&tipoPessoa=X&naturezaProcesso=0&situacaoParte=X&btn_pesquisar=Pesquisar&comrCodigo=24&numero=20.
Outro episódio é o do então vereador Mauro Alexandre Carvalho Duarte, o Mauro da Presidente (PP), que também teve sua candidatura contestada pelo Ministério Público. A acusação partiu do gerente da Viação Vale do Ouro, Marcelo José de Carvalho, que fez denúncia junto ao juiz da 328ª Zona Eleitoral, Carlos Pavanelli Batista. Marcelo Carvalho não foi encontrado para falar sobre o assunto. De acordo com o documento de acusação contra o vereador, Mauro não poderia concorrer devido ao princípio de Inelegibilidade. Segundo consta no processo, Marcelo Carvalho afirma que o candidato a vereador não pediu o afastamento do cargo de gerente, que exerce há anos na Viação Presidente, empresa que presta serviços à Prefeitura Municipal local, através de contrato de concessão. Na época, o candidato a vereador conseguiu provar, junto ao Tribunal Regional Eleitoral, o afastamento do cargo de chefia da empresa de transporte coletivo, Viação Presidente, e o aval para a sua candidatura foi concedido. Em entrevista, o vereador afirmou conciliar o cargo público com o cargo de gerente da empresa de ônibus e ainda disse desconhecer qualquer caso de impugnação de candidatura na região. Quando perguntado se lançaria candidatura para as próximas eleições municipais, Mauro afirma que “hoje não me candidataria, mas por razões pessoais”. Ao ser questionado sobre o Projeto Ficha Limpa, o vereador respondeu que é uma lei que selecionará políticos de boa conduta e que é “um projeto que deve ser respeitado, pois foi de ação popular e da Igreja”.
O candidato a deputado estadual Rômulo Antônio Viegas (PSDB), também de São João del-Rei, teve sua candidatura impugnada neste ano. Contudo, até o fechamento da matéria, a candidato não quis se pronunciar sobre o assunto. Segundo o site do TSE, impugnação de Rômulo Viegas se deu em razão da ausência de comprovação da desincompatibilização de fato, ao argumento de que o "afastamento do agente público e do servidor deve ser concreto, real, fático." e a "desincompatibilização não se perfaz se o requerimento do agente público, dirigido ao superior hierárquico, for aprovado a destempo”.
Após notificação, Rômulo Viegas entrou com recurso junto ao TSE alegando que havia apresentado declaração de desincompatibilização devidamente fornecida em papel timbrado da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), instituição à qual está vinculado, e devidamente assinada pelo reitor da universidade no prazo exigido pela legislação eleitoral. O TSE acatou o recurso da defesa e homologou a candidatura de Rômulo Viegas a deputado estadual.
Após sancionada, Ficha Limpa suscita discussões
A Lei Ficha Limpa foi aprovada graças à mobilização de mais de 1,6 milhões de brasileiros e se tornou um marco fundamental para a democracia e a luta contra a corrupção e a impunidade no país, porém é alvo de discussões entre os políticos da região. Pablo Garcia, assessor do candidato a deputado federal Dimas Fabiano (PP), ao ser perguntado sobre a situação de Dimas Fabiano no projeto Ficha Limpa, respondeu que o candidato foi absolvido em primeira instância, não havendo nenhum processo contra o mesmo. Garcia, que é advogado, declarou que o projeto Ficha limpa “acabará com os políticos que agem às escuras no Brasil... Agora o fator dinheiro (suborno) não terá vez, pois quem tem ficha suja, hoje não compra”.
Para o presidente do PT de São João del-Rei, Leonardo Silveira, estamos vivendo uma nova democracia, em que há uma maior prestação de conta por parte dos políticos.”A campanha ficou mais demorada, pois agora ocorre uma averiguação de contas antes das eleições, o que beneficia candidatos menores, além de outras vantagens como uma fiscalização mais rígida, impedindo compra de votos, os fim dos showmícios.” Leonardo acrescenta que é a favor de uma mudança nas política brasileira. “Temos que fazer uma reforma política, em que todos teriam os mesmos direitos e recursos, como, por exemplo, todos os candidatos teriam valores financeiros iguais para organizarem sua campanha”, ressaltou. Ao ser questionado sobre o projeto Ficha Limpa, declarou que “a Lei corrige uma falha que a sociedade não conseguiu corrigir no voto, é um projeto da sociedade, mesmo que esta não seja tão honesta como se diz, pois a sociedade brasileira faz o político corrupto, pois ela acomoda-se na troca de favores e depois sai às ruas pedindo honestidade política.” O presidente regional do PT sugeriu mudanças no projeto Ficha Limpa. “Poderiam acelerar o julgamento de políticos barrados pelos TREs, assim não teria como um candidato que espera ser julgado em segunda instância, por exemplo, fazer campanha política”, afirma.
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