segunda-feira, 20 de setembro de 2010

PEC dos jornalistas poderá ser votada ainda este ano

Ana Pessoa Santos e Ayalla Simone Nicolau

A Proposta de Emenda Constitucional para regulamentação da profissão de jornalista está em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF) e poderá ser aprovada após as eleições de outubro. A PEC foi recentemente aprovada na Comissão Especial da Câmara e o projeto está pronto para ir ao plenário, precisando ser aprovado duas vezes, com 308 votos favoráveis, antes de ir ao Senado.
Após a decisão por oito votos a um no STF em 17 de junho do ano passado, ficou decidido a não obrigatoriedade do diploma para exercício da profissão. Na época, o relator do caso, o ministro Gilmar Mendes, afirmou que a exigência do diploma fere o direito de liberdade de expressão garantido pela constituição federal e até comparou a profissão com a de um cozinheiro. “Um excelente chefe de cozinha poderá ser formado numa faculdade de culinária, o que não legitima estarmos a exigir que toda e qualquer refeição seja feita por profissional registrado, mediante diploma de curso superior nessa área. O Poder Público não pode restringir, dessa forma, a liberdade profissional no âmbito da culinária. Disso ninguém tem dúvida, o que não afasta a possibilidade do exercício abusivo e antiético dessa profissão, com riscos eventualmente até a saúde e à vida dos consumidores", alfinetou.
            O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) foi o único deputado a acompanhar o julgamento do diploma, e 20 dias após a decisão apresentou a PEC dos jornalistas, para restabelecer a necessidade do diploma de jornalismo no Brasil, alegando que os ministros do STF confundiram liberdade de expressão com liberdade de informação jornalística. Para ele, a PEC dá mais garantia à sociedade de um trabalho profissional, sério e comprometido com o interesse social. “Maus profissionais existem em diferentes áreas, mas não é por isso que vão acabar com o diploma de outras carreiras, como medicina, engenharia ou direito. O que o STF fez foi tão injusto que os ministros sequer relevaram o fato de o jornalista possuir o direito de sigilo da fonte. Em vista disso, como qualquer um pode ser jornalista, todos passam a ter esse direito. Podemos chegar a uma situação curiosa e absurda: um suspeito pode utilizar esse mecanismo ao ser interrogado pelas autoridades de segurança, declarando-se jornalista free-lancer, que está em serviço, e que não é obrigado a revelar nada, pois tem o direito ao sigilo da fonte”, justificou.
Pimenta afirma que a volta da exigência do diploma de jornalista é muito esperada por todos. O deputado cita pesquisa da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), em que 77% da população se posiciona favorável à volta do diploma.

A desregulamentação da profissão de jornalista
O Supremo Tribunal Federal derrubou por 8 votos a 1 a obrigatoriedade do diploma de jornalista para o exercício da profissão no dia 17 de junho de 2009. Os argumentos utilizados foram que a obrigatoriedade do diploma fere a liberdade de expressão e do livre pensamento garantidos pela Constituição de 1988 e ainda que, para se exercer o jornalismo, não é necessário conhecimento técnico específico, o que desconsidera a prática legítima do jornalismo.
Com a não exigência do diploma para ser jornalista, qualquer pessoa pode exercer a profissão e ser reconhecida como jornalista. Assim, o Código de Ética desses profissionais, que está em vigor desde 1987, perde o seu valor, e os profissionais desta área ficam sem amparo legal.
A desregulamentação da profissão causou muita revolta na comunidade jornalística, uma vez que houve um retrocesso, pois o diploma era exigido desde 17 de outubro de 1969, quando a profissão foi regulamentada pela Junta Militar que governava o país naquela época, em que já se vivia sob o regime militar.

A opinião dos profissionais da área
No meio jornalístico, é fácil encontrar opiniões divergentes quanto à exigência do diploma. Judith Brito, presidente da Associação Nacional de Jornalistas (ANJ), em reportagem publicada no Jornal do Comércio, no dia 20 de agosto deste ano, elogiou a derrubada pelo STF e condenou a tentativa de retomar a exigência no Congresso Nacional. Na mesma reportagem, com uma posição contrária, o atual presidente da Fenaj, Celso Schröder, que tomou posse recentemente, disse que a exigência do diploma é uma matéria difícil, pois enfrenta o interesse dos grandes meios de comunicação. “Mas estamos no Congresso pressionando. A proposta tramitou num prazo recorde, cinco meses. Isso mostra a mobilização dos jornalistas, junto com o apoio da opinião pública. Temos uma grande chance de terminar o ano com a obrigatoriedade do diploma restituída”, disse.
A jornalista e mestre em Estudos Lingüísticos pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Sônia Pessoa, que atua na área há 17 anos, é outra profissional que defende a obrigatoriedade do diploma. “São os jornalistas que registram e fazem chegar a milhares de pessoas as tragédias, a corrupção, as mazelas sociais. São os jornalistas que também tornam público o que há de bom, as conquistas, grandes momentos vividos pela humanidade”, ressaltou. Ela acredita que é necessária a formação acadêmica específica para o exercício da profissão, o que, no Brasil, está relacionado diretamente ao aprendizado acadêmico. “Escrever bem é inato, mas não se aprende a ter um olhar atento, a apurar corretamente, a desenvolver o ethos jornalístico da noite para o dia ou apenas pelo convívio nas redações”, concluiu.
André Eustáquio Melo de Oliveira, formado em Filosofia pela Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), atua há sete anos como editor-chefe do Jornal das Lajes, de Resende Costa. Ele criou o jornal em 2003 e, mesmo quando era obrigatório o diploma, ele não tinha o provisionamento. Em agosto deste ano, apesar de ter ingressado no curso de Jornalismo, afirma que sempre foi contrário à obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo. “Para ser um bom jornalista, acredito, vale a competência, o capital intelectual, o talento para escrever e para descobrir boas histórias e apurar as informações”, afirmou.
Ele ressalta que a profissão deve ser regulamentada, porém sem que haja a exigência do diploma. “Se há pessoas competentes, capazes de qualificar as redações dos jornais, revistas, emissoras de rádio e TV, formando opinião, atraindo leitores, por que excluí-las devido ao fato de não obterem o diploma de Comunicação?”, questionou.
            O editor do Jornal das Lajes ainda lembra que, “atualmente, a obrigatoriedade do diploma para o exercício legal do jornalismo excluiria da imprensa brasileira personalidades cuja competência é inquestionável, como o Bacharel em Direito, Arnaldo Jabor, o médico Dráuzio Varela e o teólogo Rubem Alves”, frisou.

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